quinta-feira, 30 de abril de 2009

Bastidores do Poder


Ministros do STF têm visões diferentes da Justiça

Bastaram alguns poucos dias para que a polêmica entre os ministros Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa ficasse relegada a um segundo plano. Do ponto de vista jornalístico, é compreensível. Com o câncer da ministra Dilma Rousseff, com a gripe suína e a sequência interminável de desatinos dos nossos parlamentares, era natural que a cena de pugilato verbal perdesse mesmo espaço nas manchetes de jornais e noticiários de tevê. Para quem está interessado em debater um dos mais importantes problemas brasileiros, porém, vale a pena voltar ao tema.
Nos bastidores, sabe-se que a força motiz por trás do bate-boca foi o antagonismo de visões sobre como a Justiça brasileira deve se comportar. Dono de uma trajetória que inclui passagem pelo Ministério Público, Joaquim Barbosa, o Joca, acha que é preciso fazer alguma coisa para evitar que apenas "pretos, pobres e prostitutas" sejam presos no Brasil. Imbuído deste espírito, Joca defende uma interpretação mais rigorosa quando o réu em questão for gente como Daniel Dantas ou Eliana Tranchesi.
Em ocasiões como essas, Gilmar Mendes se apega à letra fria da lei, à defesa daquilo que está escrito. Na hora de julgar, leva em consideração apenas o que está registrado nos autos. Essa postura ajuda a manter o respeito às instituições, mas não evita que algumas injustiças ocorram. Em um país como o Brasil, os mais ricos têm, de fato, mais chances de se livrar da cadeia do que o restante da população. Por causa desses posicionamentos antagônicos, é muito natural que "Joca" seja recebido como herói nas ruas do Rio de Janeiro e Gilmar Mendes seja celebrado apenas em sessões do STF, como a que ocorreu ontem.
Em relação ao arranca-rabo, já dei minha opinião em post anterior. Aos que não se lembram, um resumo: lugar de destempero é no botequim, em casa, no estádio de futebol, não na nossa Suprema Corte. Quanto à questão em si, melhorar a Justiça Brasileira, nenhum dos caminhos trilhados pela dupla Barbosa-Mendes parece ser a resposta.
Um bom início para remendar o Judiciário brasileiro é um choque de gestão. De acordo com dados compilados pelo site Consultor Jurídico, a Justiça brasileira trabalha um dia para dia descansado. Ou seja: está de folga durante seis meses do ano. Trata-se de um escândalo, um absurdo completo. Fora os feriados que os outros brasileiros usufruem, a Justiça tem sete feriados exclusivos, 20 dias de recesso, 60 dias de férias (enquanto o resto tem apenas 30) e uma série de outras regalias. Essa sem-vergonhice faz com que os processos no Brasil sejam julgados a passos de cágado. Uma ação demora em média 12 anos para terminar. Em alguns casos, quatro décadas.
É evidente que existem aqui e ali bons exemplos de eficiência. Que bom. Eles precisam ser urgentemente copiados e estendidos para todo o país. Pois se alguém deseja discutir soluções para a Justiça brasileira que trate de estudar a fundo as boas práticas daqui e do exterior. Que faça desta tarefa a sua luta (o cidadão comum agradece). O resto é jogar para a plateia, é fazer política de toga, esporte que Mendes e Barbosa têm praticado muito bem.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

CRÔNICA DA SEMANA

UM DIA AINDA VAMOS RIR DE TUDO ISSO

De tempos em tempos, circula na Internet uma sentença que teria sido proferida no ano de 1833, no município de Porto da Folha, estado de Sergipe, em um caso de estupro. Na tal sentença, foi imposta a seguinte pena ao acusado: “Condeno o cabra Manoel Duda pelo malifício que fez a mulher de Xico Bento e por tentativa de mais malifícios iguais, a ser capado, capadura que deverá ser feita a macete”.

Não sei se o caso é verídico, pois nesta época já estava em vigor o Código Criminal do Império e este tipo de pena não era previsto. Bom, verdade ou não, só de imaginar a execução da pena me causa arrepios.
Falando sério, no Código Civil de 1916, que vigorou até 2002, constava o seguinte artigo:
“Art. 178. Prescreve:
§ 1º Em dez dias, contados do casamento, a ação do marido para anular o matrimônio contraído com mulher já deflorada.”

Traduzindo: o marido tinha dez dias para ingressar com a Ação de Anulação de Casamento, contados desde a data do casamento, caso descobrisse que sua mulher não fosse mais virgem. É verdade. Era assim mesmo. Hoje pode parecer engraçado e curioso, mas para as mulheres significava uma tremenda falta de respeito à sua dignidade e à sua liberdade.
Até 2005, no Código Penal Brasileiro, que é o Decreto-Lei 2.848, de 07 de dezembro de 1940, existiam alguns dispositivos absurdos com relação às mulheres. O crime de posse sexual mediante fraude (art. 215), por exemplo, tinha a seguinte definição: “ter conjunção carnal com mulher honesta, mediante fraude”. Da mesma forma, o crime de atentado ao pudor mediante fraude (art. 216), até 2005, tinha a seguinte definição: “induzir mulher honesta, mediante fraude, a praticar ou permitir que com ela se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal.” Parece brincadeira, mas é verdade: a vítima de tais crimes sexuais era a “mulher honesta”. Aquelas que não fossem honestas, portanto, não poderiam ser vítimas de posse sexual mediante fraude ou de atentado ao pudor mediante fraude. Esses crimes ainda estão previstos no atual Código Penal, que é o mesmo de 1940, mas uma Lei de 2005 (Lei 11.106/05) retirou a expressão “mulher honesta”.
Mas o sistema de penas no Brasil já foi bem pior. O Código Criminal do Império, de 1830, por exemplo, estabelecia as penas de morte na forca, pena de galés, pena de prisão com trabalho, banimento, degredo, desterro e açoutes. No caso do enforcamento, por exemplo, dispunha o código:
“o réu com o seu vestido ordinario, e preso, será conduzido pelas ruas mais publicas até á forca, acompanhado do Juiz Criminal do lugar, aonde estiver, com o seu Escrivão, e da força militar, que se requisitar. Os corpos dos enforcados serão entregues a seus parentes, ou amigos, se os pedirem aos Juizes, que presidirem á execução; mas não poderão enterral-os com pompa, sob pena de prisão por um mez á um anno”.
Neste mesmo código, o crime de estupro era tratado assim:
Art. 219. Deflorar mulher virgem, menor de dezasete annos.
Penas - de desterro para fóra da comarca, em que residir a deflorada, por um a tres annos, e de dotar a esta.
Seguindo-se o casamento, não terão lugar as penas.
Da mesma forma ocorria em outros crimes contra a liberdade sexual das mulheres do império: o homem que aceitasse se casar com a ofendida ficava livre da pena. O casamento salvava a honra das mulheres violentadas! Era um favor do criminoso à sua vítima!
Durante o Império, o Código Criminal foi reformado pela última vez em 1886, dois anos antes da abolição, quando foi extinta a pena de “açoutes”.
O Código Penal que conhecemos hoje é o Decreto-Lei 2.848, de 07 de dezembro de 1940, com várias pequenas reformas, assinado por Francisco Campos e Getúlio Vargas. Este código está dividido em parte geral e parte especial e tem 361 artigos. A parte geral cuida da definição das penas, da aplicação as penas, da imputabilidade, da ação penal da extinção da punibilidade e outros conceitos e fundamentos. A parte especial define os crimes contra a pessoa, contra o patrimônio, contra os costumes, contra a família etc.
Assim, por exemplo, o artigo 121 define o crime de homicídio (matar alguém) e estabelece a pena de reclusão de 06 a 20 anos. Se o homicídio for qualificado, a pena será de 12 a 30 anos de reclusão. E mais: o artigo 157 define o crime de roubo e, para o caso do roubo seguido de morte, a pena é de reclusão de 20 a 30 anos.
Ora, se hoje estamos nos divertindo com a pena de “capadura a macete” e nos indignamos com as penas de morte pela forca e com a discriminação sofrida pelas mulheres, não podemos ter dúvidas de que em alguns anos nossas penas atuais também serão objeto de riso e indignação. É assim mesmo. É a história! Um detalhe: a história não se faz sozinha ou apenas com leis. É o resultado das lutas das mulheres e dos homens
!

segunda-feira, 6 de abril de 2009

PENSAMENTOS


O ENCANTO NOSSO DE CADA DIA!
Ainda bem que o tempo passa! Já imaginou o desespero que tomaria conta de nós se tivéssemos que suportar uma segunda feira eterna? A beleza de cada dia só existe porque não é duradoura. Tudo o que é belo não pode ser aprisionado, porque aprisionar a beleza é uma forma de desintegrar a sua essência. Dizem que havia uma menina que se maravilhava todas as manhãs com a presença de um pássaro encantado. Ele pousava em sua janela e a presenteava com um canto que não durava mais que cinco minutos. A beleza era tão intensa que o canto a alimentava pelo resto do dia. Certa vez, ela resolveu armar uma armadilha para o pássaro encantado. Quando ele chegou, ela o capturou e o deixou preso na gaiola para que pudesse ouvir por mais tempo o seu canto. O grande problema é que a gaiola o entristeceu, e triste, deixou de cantar. Foi então que a menina descobriu que, o canto do pássaro só existia, porque ele era livre. O encanto estava justamente no fato de não o possuir. Livre, ele conseguia derramar na janela do quarto, a parcela de encanto que seria necessário, para que a menina pudesse suportar a vida. O encanto alivia a existência... Aprisionado, ela o possuia, mas não recebia dele o que ela considerava ser a sua maior riqueza: o canto! Fico pensando que nem sempre sabemos recolher só encanto... Por vezes, insistimos em capturar o encantador, e então o matamos de tristeza. Amar talvez seja isso: Ficar ao lado, mas sem possuir. Viver também. Precisamos descobrir, que há um encanto nosso de cada dia que só poderá ser descoberto, à medida em que nos empenharmos em não reter a vida. Viver é exercício de desprendimento. É aventura de deixar que o tempo leve o que é dele, e que fique só o necessário para continuarmos as novas descobertas. Há uma beleza escondida nas passagens... Vida antiga que se desdobra em novidades. Coisas velhas que se revestem de frescor. Basta que retiremos os obstáculos da passagem. Deixar a vida seguir. Não há tristeza que mereça ser eterna. Nem felicidade. Talvez seja por isso que o verbo dividir nos ajude tanto no momento em que precisamos entender o sentimento da tristeza e da alegria. Eles só são suportáveis à medida em que os dividimos... E enquanto dividimos, eles passam, assim como tudo precisa passar. Não se prenda ao acontecimento que agora parece ser definitivo. O tempo está passando... Uma redenção está sendo nutrida nessa hora... Abra os olhos. Há encantos escondidos por toda parte. Presta atenção. São miúdos, mas constantes. Olhe para a janela de sua vida e perceba o pássaro encantado na sua história. Escute o que ele canta, mas não caia na tentação de querê-lo o tempo todo só pra você. Ele só é encantado porque você não o possui. E nisto consiste a beleza desse instante: o tempo está passando, mas o encanto que você pode recolher será o suficiente para esperar até amanhã, quando o passaro encantado, quando você menos imaginar, voltar a pousar na sua janela.